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terça-feira, 19 de abril de 2011

Uma medida para governança

Valor Econômico

Estudo cria índices para medir diversidade e nível de atividade dos conselhos de administração nas companhias.

Catherine Vieira e Fernando Torres | De São Paulo

Quantas vezes o conselho da companhia aberta da qual você é sócio se reúne por ano? E quais as formações dos conselheiros e de quanto tempo eles dispõem para analisar os detalhes dessa empresa? Há mulheres e estrangeiros? Aspectos como esses, que medem a dinâmica de funcionamento e de diversidade dos conselhos de administração, vêm sendo cada vez mais discutidos pelos estudiosos da chamada governança corporativa lá fora. E estão sendo analisados pela primeira vez nas empresas brasileiras pelo professor Alexandre Di Miceli, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP.

Ele levantou informações de 215 empresas listadas na BM&FBovespa e montou um índice que mede a diversidade e outro que analisa a passividade dos dois conselhos. Da combinação desses dois surge um indicador de alinhamento às boas práticas nos quesitos analisados.

Na ponta de cima do ranking aparecem EDP, Cemig, BM&FBovespa, Celesc, CCR e LLX, respectivamente. Na de baixo estão Hércules, Grazziotin, Brasmotor e Schulz (veja tabela acima). Isso não significa que as empresas sejam melhores ou piores, mas que são mais ou menos alinhadas às práticas analisadas.

Para medir a propensão à atividade ou à passividade, ele levou em conta o número de encontros num ano, a existência de comitês, o número de membros independentes e o nível de dedicação dos conselheiros. "Se alguém está em vários conselhos ou se é o principal executivo numa outra companhia, essa pessoa tende a ter um nível de dedicação menor para aquela companhia específica", pondera Di Miceli.

Ele ressalta que é crucial ter conselheiros dedicados, que possam se aprofundar nos assuntos e questionar com propriedade a companhia. Isso porque, destaca o professor, existe uma tendência natural em qualquer grupo para seguir um líder, conforme mostram estudos comportamentais que vêm sendo repetidos há alguns anos. "É mais comum que essa liderança seja exercida por uma pessoa que esteja mais no dia a dia da empresa, que tenha muitas informações e interesse em que os projetos sejam viabilizados", diz o pesquisador.

Já para avaliar a diversidade, ele levou em conta o número de mulheres, estrangeiros e as diferentes formações acadêmicas, além da idade e do tempo médio nos cargos dos membros do conselho. "Se todos são engenheiros, formados pela mesma escola e com a mesma idade, a tendência é que não surjam muitos pontos de vista diferentes", explica. Os grupos muito homogêneos tenderiam a reforçar ideias comuns e isso poderia levar à não observância de alguns riscos ou oportunidades que alguém com uma visão bem diferente poderia enxergar melhor.

A questão da diversidade de gênero, bem pouco discutida no Brasil, tem uma dimensão bem maior em alguns países desenvolvidos da Europa, por exemplo, como a Noruega. "Lá fora se discute muito essa questão da diversidade. Aqui o debate é ainda muito pequeno, é um tema ainda embrionário, não há estratégias das empresas focadas nisso", diz Miceli, que pretende agora repetir a análise todos os anos, para que se possa medir a evolução dos índices de passividade e diversidade de cada empresa e ter um termômetro geral.

Por aqui, porém, existe um sentimento de que já houve avanços na questão da composição dos conselhos. Cynthia Rejowski, diretora da empresa de recrutamento Hays Executive, diz que há uma tendência de profissionalização dos conselhos de administração no Brasil, com maior frequência entre aquelas que têm investidores estrangeiros ou fundos de participação no quadro social.

Segundo ela, ainda que em boa parte dos casos não seja bom prescindir do conhecimento do fundador de uma companhia, é comum haver uma sobreposição entre a propriedade e a gestão do negócio, o que tira a efetividade do trabalho do conselho.

Na visão de Cynthia, o fato de conselheiros terem a mesma formação acadêmica e a mesma idade não é um problema, já que a bagagem que cada um traz depende mais da experiência profissional deles, que pode ser distinta. "A gente está mais interessada em boa formação e numa trajetória de sucesso profissional relevante. Isso sim faz diferença", afirma, revelando que costuma procurar pessoas com histórico de administrador.

Ainda em relação ao perfil, ela diz que costuma verificar se o conselheiro combina com o perfil da empresa. "A gente mede se ele vai aderir à cultura da organização. Tem gente que gosta de vários nós e outros preferem coisas mais tranquilas", diz.

Em relação à disponibilidade de profissionais para trabalhar como conselheiros, Cynthia diz que hoje é difícil encontrar pessoas com perfil adequado, mas que no futuro será mais fácil, já que muitos executivos de hoje estão se preparando para atuar em conselhos no fim da carreira.

Já Olanir Grazziotin, diretor da empresa gaúcha Grazziotin, argumenta que, apesar de o conselho da empresa realizar apenas duas reuniões formais por ano, o grupo está em contato constante. "Discutimos e trocamos ideias, principalmente por e-mail. O contato não é apenas nas duas reuniões presenciais", diz. Segundo ele, existem dois membros independentes no conselho, eleitos pelos minoritários. E uma preocupação de que os administradores entendam bem da região onde o negócio está focado. A Grazziotin é uma loja de departamentos com sede em Passo Fundo (RS). "O que temos de ter no conselho, médicos? Nós buscamos gente que entenda do negócio e da região", conclui.

Procuradas, Schulz e Hércules não se pronunciaram. A Whirlpool, que controla a Brasmotor, informou que espera ter acesso ao estudo para analisar seus pontos e verificar possíveis melhorias.

Conselhos têm efeito manada

Muita gente prefere errar junta do que se arriscar a estar certa sozinha. Esse comportamento humano pode ser visto em vários vídeos no YouTube. Num deles, cinco pessoas estão numa sala, sendo uma "cobaia" e quatro atores. Quando os atores dão a mesma resposta errada para uma pergunta, o indivíduo testado até se mostra contrariado, mas costuma errar junto com os demais. Se um dos atores dá a resposta certa, aquele que é testado se sente confortável para acertar e contrariar os demais.

Segundo o professor Alexandre Di Miceli, esse tipo de comportamento pode se repetir em conselhos de administração, assim como o de obediência a um líder.

Isso pode ser verificado, segundo ele, no teste de Milgram. No experimento, pessoas comuns são requisitadas a acionar uma máquina que dá choques em outro indivíduo - no caso um ator - quando ele erra em um teste de memória. A intensidade do choque aumenta a cada erro. Orientadas por um cientista - também ator - cerca de dois terços das pessoas são capazes de dar choques letais no outro, apenas por confiarem no "especialista". (CV e FT).

Fonte: Matéria divulgada no site da Fenacon

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