Época
Castigados pela crise, os países ricos facilitam a obtenção de visto e dão apoio a microempresários brasileiros com dinheiro e boas ideias
Marcos Coronato e Daniela Cornachione
"Vamos colocar um tapete vermelho para você", disse o primeiro-ministro britânico, David Cameron, num discurso em novembro, dirigindo-se a cada microempresário estrangeiro disposto a abrir negócio no Reino Unido. Ele anunciava um novo tipo de visto que facilitará a imigração de quem tenha uma boa ideia e menos que as 200 mil libras (R$ 535 mil) atualmente exigidas para investidores estrangeiros. Outros países ricos seguem a mesma estratégia e facilitam a entrada de empreendedores. "A Europa está envelhecendo e precisa de sangue novo", diz o francês Yann Duzert, coordenador do MBA Global Premium da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro. "A crise deixou os europeus mais cautelosos, com menos vontade de investir. E os brasileiros estão otimistas."
Ainda não se conhece o resultado dessa estratégia, pois ela é recente. Mas apenas esse esforço já é algo notável. Além do Reino Unido, França e Alemanha dão bons exemplos. Os três países têm agências de investimento com representações mundo afora. Antes, elas se dedicavam principalmente a atrair grandes investidores. Agora, ajudam também microempresários. A Agência Francesa para Investimentos Internacionais (AFII) tem escritórios em 23 países. O brasileiro foi aberto em junho de 2010. "O país está crescendo e mais propenso a se internacionalizar. É normal que os países desenvolvidos estejam atentos a isso", diz François Removille, diretor-geral da AFII no Brasil. O Reino Unido também está presente por aqui com sua agência, a UKTI. "As pequenas companhias levam tecnologia e inovação para o país anfitrião. Conforme crescem, geram empregos, pagam impostos e espalham conhecimento", afirma Digby Jones, um lorde que foi presidente da confederação das indústrias britânicas e hoje viaja o mundo promovendo o Reino Unido. A agência alemã GTaI, criada em 2009, é responsável por orientar estrangeiros que querem investir no país.
Imigrar para a Europa como empreendedor ficou mais fácil nos últimos anos. Na França, depois de uma reforma de lei em 2009, o estrangeiro que cria uma empresa passa a concorrer com mais facilidade ao visto de três anos numa categoria chamada "competências e talentos". O imigrante que já mora lá recebe isenção de impostos e apoio para montar o negócio. Quem cria uma empresa pode trazer empregados de seu país de origem e, desde dezembro, estender a eles benefícios fiscais e facilidades nas tratativas de visto. Na Alemanha, o empreendedor precisa esperar apenas três anos para pedir o visto permanente, enquanto outras categorias de imigrantes devem esperar ao menos cinco. O Reino Unido vem levantando barreiras contra outros tipos de imigrantes, mas não contra microempresários. Estuda até reduzir o investimento mínimo exigido deles.
Diante da movimentação do outro lado do Atlântico, os Estados Unidos e o Canadá reagiram. A Europa está longe de ser reconhecida como o melhor continente para gente com espírito empreendedor – fama que os americanos construíram ao longo de séculos. Mas dados recentes mostram que os Estados Unidos estão perdendo a dianteira como maternidade de novos negócios no mundo. Em 2005, 12% dos americanos haviam fundado companhias, em comparação com 9% do resto do mundo. Em 2009, a fatia de americanos empreendedores caiu para 8%, enquanto a do resto do mundo subiu para 11%, na pesquisa Monitor Global de Empreendedorismo. Estados Unidos e Canadá já dão sinais de qual será sua resposta. Ambos estudam criar uma nova categoria de visto para estrangeiros, o Startup. Ele diminuiria as exigências burocráticas e reduziria o investimento mínimo inicial requerido para 150 mil dólares canadenses no Canadá e US$ 250 mil nos Estados Unidos (atualmente, os valores estão em 300 mil dólares canadenses e US$ 500 mil, respectivamente).
Para os países envolvidos nessa corrida, a vantagem é evidente. Alemanha e Canadá exibem sinais econômicos um pouco mais promissores, mas Estados Unidos, Reino Unido, França e vários outros países europeus ainda sofrem para tentar superar a crise global. Eles derrapam na falta de empregos e de investimento. Contra esses males, o remédio mais eficaz é incentivar a semeadura de novos negócios, pequenos, inovadores e necessitados de mão de obra.
Para os empreendedores, além de ter mais oportunidades de prosperar, abrir um escritório num desses países é mais fácil do que no Brasil, que maltrata os negócios com excesso de burocracia e impostos. "É tranquilo fazer negócio em Londres. Em termos operacionais, é muito mais fácil abrir uma empresa na Inglaterra do que no Brasil", afirma Alexandre Bruscato, dono de uma empresa fabricante de artefatos de acrílico. Ele e a mulher e sócia, Patrícia, não pensam em sair de Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul, por enquanto. Mas abriram em Londres uma filial de sua marca de decoração, a Allê. Ficaram impressionados com o atendimento especial que receberam. Essa diferença de tratamento é bem retratada em diversas pesquisas. O Reino Unido ficou na 17ª posição do ranking mais recente do Banco Mundial sobre facilidade para abrir uma empresa em 183 países. O Brasil ficou em 128º, muito atrás do Chile (62º) e do México (67º). Para criar um negócio aqui é preciso lidar com 15 procedimentos, que duram por volta de 120 dias. No Reino Unido, são seis procedimentos em seis dias. A França (21º) exige cinco, que duram uma semana. Os países que lideram esse ranking são Nova Zelândia, Austrália e Canadá.
As agências de investimento ajudam os estrangeiros de várias formas, começando com a burocracia para abrir uma empresa e pagar impostos. "Alguns lugares no Reino Unido oferecem gratuitamente serviços legais ou consultoria para encontrar clientes", diz o lorde Jones. O casal de empresários brasileiros Alexandre e Patrícia recebeu apoio do consulado britânico no Brasil e da agência Think London, responsável por atrair negócios para a capital inglesa. "Eles nos indicaram contadores, advogados, deram o caminho. O apoio foi muito importante", afirma Patrícia. Hoje, o casal tem em Londres um escritório virtual, com endereço e número de contato, mas sem funcionários trabalhando no local. A equipe, terceirizada, é composta de sete pessoas. São representantes comerciais, assessores de comunicação e funcionários que transportam os produtos enviados do Brasil. "Estamos pensando em ter um showroom próprio neste ano, com alguém trabalhando lá", diz. Se o Brasil não gosta de seus empreendedores, deve tomar cuidado. Há quem goste.
Fonte: Matéria divulgada no site da Fenacon
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