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segunda-feira, 5 de maio de 2014

Desoneração da folha dobra de custo para a União em 2014

Roberta Mello

MARCO QUINTANA/JC
Para Schuch, manutenção das vagas em período de crise mostra eficácia da medida
Para Schuch, manutenção das
 vagas em período de crise
ostra eficácia da medida
Em janeiro e fevereiro deste ano, deixaram de entrar R$ 3,59 bilhões nos  cofres públicos em função do benefício concedido a diversos setores da economia. No mesmo período de 2013, o montante era de R$ 1,6 bilhão.

Com a justificativa de incentivar a contratação de mais trabalhadores e de estimular a formalização dos empregados, a desoneração fiscal da folha de pagamento entrou na agenda política a partir de 2008. Foi por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 233/2008, responsável por encaminhar a última sugestão de reforma tributária do governo federal, que o assunto ganhou espaço no planejamento federal – isso sem levar em conta a diminuição dos impostos sobre contratações para empresas enquadradas no Simples Nacional, em vigor desde 2007. 

Tendo como espelho o que ocorreu em grande parte dos países europeus e nos Estados Unidos, o Brasil busca diminuir a carga tributária sobre os gastos com funcionários e suprir o déficit na arrecadação aumentando os impostos calculados com base no lucro e no faturamento das organizações. A mudança tem como objetivo beneficiar principalmente as empresas que geram mais postos de trabalho. Contudo, o único reflexo dessa medida não é o aumento no volume de trabalhadores empregados formalmente. 

Dados divulgados este mês pela Receita Federal do Brasil (RFB) apontam que a renúncia fiscal com a desoneração da folha de pagamento mais que dobrou nos dois primeiros meses de 2014 na comparação com o mesmo período de 2013. A inclusão de novos setores da economia que não eram beneficiados pela medida no início do ano passado levou o Tesouro Nacional a deixar de arrecadar R$ 3,59 bilhões em janeiro e fevereiro deste ano, ante R$ 1,6 bilhão no primeiro bimestre de 2013.

Ao todo, 16 setores foram adicionados à lista desde julho do ano passado. Dez setores da indústria, do comércio e de serviços, além da construção civil, entraram no ranking de beneficiados pela política tributária ainda em 2013. Em janeiro deste ano, cinco segmentos ligados ao transporte, à construção e às empresas jornalísticas também passaram a fazer parte do novo sistema de contribuição para a Previdência Social.

Conforme a Receita Federal, durante o ano passado inteiro, o Tesouro Nacional deixou de arrecadar R$ 13,2 bilhões com a medida. O novo regime começou a ser adotado em 2011 para estimular o emprego e evitar demissões nas indústrias de couro e calçados, nas confecções e nas empresas de call center e de tecnologia da informação. Atualmente, 56 segmentos da indústria, do comércio, dos serviços e dos transportes são beneficiados pela desoneração da folha.

O contador e coordenador da Comissão de Estudos de Organizações Contábeis do Conselho Regional de Contabilidade (CRCRS), Márcio Schuch, argumenta que nem toda queda na arrecadação do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) resulta em prejuízo. “Ao tirar a carga de tributos sobre a folha, uma parte do valor é transferido, de certa forma, para a carga que recai sobre o faturamento ou lucro da empresa”, pontua. Segundo Schuch, ao analisar a queda na arrecadação do INSS é preciso olhar para o outro lado, o que significa diagnosticar se não houve aumento na arrecadação sobre lucro e faturamento.

Em vez de arcar com 20% da folha de pagamento como contribuição patronal à Previdência Social, os setores beneficiados pela desoneração passaram a pagar 1% ou 2% do faturamento, dependendo da atividade. A mudança beneficia principalmente as empresas intensivas em mão de obra (que geram mais empregos). Como as alíquotas são mais baixas do que os níveis que manteriam a arrecadação e sustentabilidade da Previdência Social, a desoneração implicaria custos para o governo.

O contador Paulo Schnorr concorda que as empresas beneficiadas podem utilizar mais mão de obra assalariada, pois o encargo previdenciário é menor, mas lembra que, se o fisco abre mão de parte da arrecadação, certamente alguém deverá pagar esta conta e, com certeza seremos nós, cidadãos.




Contadores devem ficar atentos às mudanças

O contador é o profissional responsável por diagnosticar os reflexos da desoneração e trazer segurança financeira à empresa em meio a tantos questionamentos. Instituído por meio de Medidas Provisórias (MPs), o prazo para que os benefícios de desoneração da folha de pagamento se mantenham em vigor vai até o final deste ano, mas pode ser prorrogado, o que traz certa instabilidade à profissão contábil. 

O contador Paulo Schnorr lembra que os contadores são diretamente influenciados pelas medidas provisórias e leis. Para ele, é preciso elaborar uma folha de pagamento especial, diferente da tradicional, para as empresas que têm setores voltados à produção de bens na lista de desoneração, daqueles que não estão ligados à produção de tais bens. 

Além disso, o profissional defende a emissão de um Documento de Arrecadação de Receitas Federais (Darf) específico sobre o faturamento dessas empresas, que muitas vezes têm diferentes enquadramentos fiscais e previdenciários. Ao preencher o programa oficial gerador do INSS e do FGTS, denominado Sefip/Gfip, como o programa não está prevendo a desoneração parcial de determinados casos, existe a necessidade de se lançar manualmente esses descontos, sob pena de um cálculo equivocado do valor a recolher. 

“Isso é muito burocrático e oneroso para os contadores. A folha de pagamento passou a depender da contabilidade para apurar o percentual de receita aferida em cada modalidade, sendo que o prazo para entrega da Gfip continuou sendo o dia 7, o que é muito exíguo”, adverte Schnorr.

Apesar do prazo pré-definido, o contador e coordenador da Comissão de Estudos de Organizações Contábeis do Conselho Regional de Contabilidade (CRCRS), Márcio Schuch, prevê que as desonerações se mantenham. Seja através de uma nova MP ou de uma proposta da Câmara dos Deputados ou Senado Federal, a tendência é que os setores beneficiados atualmente se juntem a outros na tentativa de, de certa forma, iniciar uma reforma tributária. 

Empresas e trabalhadores nem sempre saem ganhando 

Ainda há divergências quanto à eficiência das medidas de compensação tributária no aumento da formalização e na geração de novos empregos ou em torno dos benefícios gerados às empresas. Fato é que nem sempre as pessoas jurídicas saem ganhando com a alteração tributária. Tampouco o trabalhador vê reflexos claros no número de novas vagas ou no próprio salário.

Para o contador Márcio Schuch, a manutenção dos níveis de empregabilidade mesmo durante um período turbulento para a economia nacional (após 2008) já pode servir como indício de sucesso. “Manter os empregos já pode ser tido como um efeito da desoneração da folha”, frisa.

O contador Paulo Schnorr acrescenta que essa é uma questão muito relativa, pois uma contratação não passa somente pelo encargo previdenciário, mas por inúmeros fatores, tais como qualificação do trabalhador, remuneração e demais encargos trabalhistas (como FGTS, absenteísmo, licenças, cláusulas sociais previstas em dissídios, estabilidade, rotatividade, multas rescisórias, aviso prévio com adicionais), entre outros pontos.

Sendo assim, é preciso comparar os valores do que diminui de um lado (folha de pagamento) e o que aumenta de outro (lucro e faturamento). Uma empresa que tem larga utilização de mão de obra assalariada terá vantagem se o seu faturamento não for muito elevado, como, por exemplo, os setores de construção civil. Já as empresas que não utilizam mão de obra e baseiam sua produção no uso de tecnologia e maquinário saem perdendo, pois o faturamento é alto e a folha de pagamento é baixa, como é o caso da indústria metalúrgica.

O impacto dos impostos sobre a folha de pagamentos no mercado de trabalho também tem sido estudado como um problema de incidência tributária. Sendo maior sobre os empregados, a possível desoneração causaria elevação dos salários ou mais contratações. No entanto, se a incidência for maior sobre os empregadores, a desoneração elevaria o número de empregados ou aumentaria. 

Conforme o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), os encargos sociais e os salários são dois componentes do custo total do trabalho. Salários devem ser entendidos como o total da remuneração, direta e indireta, recebida pelo trabalhador como contrapartida pela prestação de trabalho a um empregador. As contribuições sociais referem-se aos encargos diretamente em benefício do trabalhador, ou seja, são responsabilidade do trabalhador.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), “o conceito estatístico de custo do trabalho compreende a remuneração pelo trabalho realizado, os pagamentos relativos ao tempo pago, mas não trabalhado, bônus e gratificações, o custo da comida, bebida e outros pagamentos em espécie, o custo de habitações sociais a cargo dos empregadores, gastos patronais com encargos sociais”. Em resumo, o custo total do trabalho é a soma das despesas remuneratórias e de manutenção do trabalhador, encargos sociais incidentes sobre a folha de salários, treinamento e benefícios.

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