Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, o equivalente ao Produto Interno Bruto (PIB)
da Argentina, é desperdiçado no Brasil. Quase nada está imune à perda.
Uma lista sem fim de problemas tem levado esses recursos e muito mais.
De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à ineficiência do
Estado e do setor privado, a falhas de logística e de infraestrutura, ao
excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de
planejamento.
Além de dinheiro, que poderia ser investido em educação, saúde e
transporte público, escorre pelo ralo muitas outras oportunidades. O
Brasil deixou passar a bonança externa — entre 2003 e 2008, o mundo
viveu a sua era de ouro, puxado pelo supercrescimento chinês — sem fazer
as reformas estruturais necessárias à economia. Agora, se vê sem
capacidade de colher os frutos do bônus demográfico, período único em
que as nações usam a sua força de trabalho para se tornarem ricas. De
farto e próspero, o país ganha cada vez mais a cara do desperdício.
Não à toa, o Brasil está tomando uma sova de desconfiança. O real, que ostentou, por anos, o status de Moeda
forte, é hoje a divisa no mundo que mais perde valor ante o dólar. Para
piorar, o crescimento médio anual do PIB, de 1,8%, é o menor em 20
anos. A Inflação se mantém sistematicamente próxima ao teto da meta, de 6,5%. Os Investimentos
produtivos mínguam e a confiança das famílias está no chão. Mais uma
vez, o futuro que nos parecia tão perto começa a tomar feições de
miragem.
O período de forte crescimento global na década passada, quando
havia grande fluxo de capitais e os nossos produtores agrícolas eram
muito bem pagos para alimentar o planeta, deu a folga necessária para a
administração pública aposentar a incompetência e a ineficiência e
entregar Serviços
melhores, apesar da montanha de dinheiro que os brasileiros depositam
todos os meses nos cofres da Receita Federal. Nada foi feito.
“Infelizmente, fizemos a Opção pelo atraso”, resume o Economista Paulo Rabello de Castro, presidente do Instituto Atlântico e integrante do Movimento Brasil Eficiente.
AMARRAS
Nas últimas três semanas, o Estado de Minas vasculhou o país para
ir além do que se habituou a chamar de custo Brasil. O resultado
encontrado é assustador. As manifestações que tomaram as ruas entre maio
e junho surpreenderam muita gente. Mas o desperdício justifica o
sentimento de basta. Não é mais aceitável que uma nação com tantos
recursos naturais, apontada como o maior celeiro do mundo, jogue no
lixo, todos os anos, o equivalente a quase um quarto do PIB nacional.
Essa é a parte visível dos prejuízos, baseada em estimativas
conservadoras, admitem os especialistas.
A falta de cultura de manutenção e de planejamento e um sistema
político que facilita os desmandos e os malfeitos se transformaram em
barreiras que impedem que tanto dinheiro seja revertido em benefícios à
sociedade. Água, energia elétrica, comida — tudo vai fora. Por causa das
amarras da burocracia, as firmas perdem 2,6 mil horas por ano. Em
países desenvolvidos esse tempo é 10 vezes menor. Tal fatura, se
convertida em dinheiro, pode chegar a R$ 200 bilhões. “Há também o
desperdício moral. Todos esses problemas desmoralizam a capacidade desse
eu coletivo, que é a Sociedade
brasileira, de ter vontade de perseguir a eficiência, a produtividade e
o comprometimento com o sucesso”, argumenta Rabello de Castro.
A pesada Carga Tributária
é o veículo por meio do qual o governo suga os recursos que serviriam
de energia vital para as empresas e para as famílias. Verbas que viram
gastos estéreis, jogados em obras que não andam. A ineficiência do
Estado, contudo, tem queimado mais que dinheiro, despreza as chances de
brasileiros que amargam uma vida de pobreza, impede uma educação formal
de qualidade, ceifa vidas em leitos de hospitais sem estrutura.
Um carimbo em tempo hábil pode ser a diferença entre viver e
morrer, ao menos para quem depende da saúde pública no interior do país.
Em Águas Lindas (GO), distante quase 40 quilômetros da sede do
Ministério da Saúde, em Brasília, é comum os pacientes terem de se
deslocar para a Capital federal em busca de atendimento. Muitos morrem no meio do caminho.
O socorro não pode ocorrer no município porque um dos hospitais da
cidade, que deveria ter quase 300 leitos, está abandonado. A licitação
para a obra foi embargada devido à corrupção. “É preciso reconhecer que a
forma como o Estado contemporâneo atua não é mais capaz de atender as
necessidades da população”, observa Márcio Pochmann, presidente da
Fundação Perseu Abramo. Ele pondera que a forma de organização dos
governos está ultrapassada, e encontrar maneiras de pensar e executar
políticas públicas é um desafio não apenas do Brasil.
Diante de tanto descalabro, os especialistas são unânimes em um
ponto: as ineficiências do Brasil são a maior fonte de riqueza e de
oportunidade. Se todos os recursos desperdiçados fossem devidamente
aproveitados, o país trocaria a cadeira de emergente por uma de
desenvolvido. O PIB potencial, que é a taxa de crescimento possível sem
gerar Inflação e desequilíbrios, seria bem maior que os 2% ou 2,5% atuais. A população poderia ser beneficiada verdadeiramente com Serviços públicos e privados eficientes.
Máquina emperrada
O excesso de papéis, carimbos e processos piora o quadro de
desperdício no Brasil. O relatório da International Business Report, da Auditoria
Grant Thornton, mostra que 50% das empresas citam a burocracia e as
excessivas regulações como principais fatores de limitação para o
crescimento e Expansão
dos negócios. As companhias desperdiçam 2,6 mil horas com burocracia
por ano, o equivalente a 108 dias corridos — o dobro da média mundial.
No ranking das nações mais burocráticas do planeta, a bandeira verde e
amarela perde apenas para a Grécia, onde 57% dos executivos colocam o
problema como principal entrave, e para a Polônia, onde essa taxa é de
52%.
“O burocrata não tem ideia do tamanho do roubo que ele pratica em
nome da boa-fé sobre o cliente dele, que é o contribuinte, quando ele
complica a vida do cidadão”, pondera Paulo Rabello de Castro, do
Instituto Atlântico. Ele alerta que, no Brasil, a quantidade de horas
perdidas com burocracia é 10 vezes maior que a observada em países
desenvolvidos. Rabello estima que as perdas com procedimentos excessivos
podem chegar a R$ 200 bilhões por ano.
Márcio Pochmann, da Fundação Perseu Abramo, explica que a
burocracia não é algo totalmente ruim. Na visão dele, é impossível a uma
grande empresa ou ao governo funcionar sem processos que organizem. “O
problema é quando a burocracia se torna um fim em si mesma e deixa de
ser apenas o meio pelo qual as coisas transitam e são organizadas”, diz.
Para ele, no entanto, o Estado brasileiro, de uma maneira geral, é
eficiente em sua burocracia, especialmente pelo tamanho. “Isso não quer
dizer que as ineficiências não existam. Elas são localizadas e não são
poucas.”
Todas essas perdas com burocracia e ineficiência, porém, poderiam ser evitadas. Técnicos do Tribunal de Contas
da União (TCU) são enfáticos ao afirmar que a corrupção, os
procedimentos excessivos, a falta de planejamento e o descompromisso na
execução de projetos alimentam os desperdícios no país.
Gula tributária
A Carga Tributária
no Brasil é uma das mais pesadas no mundo. Pelos cálculos do Instituto
Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o brasileiro trabalhou
cinco meses neste ano, até 31 de maio, apenas para pagar impostos. Se
fosse na Argentina ou nos Estados Unidos, seriam aproximadamente três
meses. Comparado aos anos 1970, esse tempo dobrou no país. Atualmente,
são pagos pelos contribuintes 63 tributos.
Fonte: Correio Braziliense
Matéria publicada no site Classe Contábil
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