Refis deu chance à empresa de voltar a investir em expansão, diz Moi.
Quem nunca
passou por um momento de aperto financeiro que atire a primeira pedra.
Em 2009, de acordo a Receita Federal do Brasil, o programa de
parcelamento especial, denominado de Refis da Crise (Programa de
Recuperação Fiscal), teve a adesão de 577,9 mil contribuintes, sendo que
apenas 445 mil possuíam condições de realizar as negociações. O passivo
tributário calculado pelo órgão chegou a R$ 1 trilhão. Após o
encerramento das etapas de negociação, apenas 212,4 mil conseguiram
consolidar seus débitos nas modalidades à vista ou parcelado. A Lei nº
11.941, que originou o Refis da Crise, permite a regularização das
dívidas tributárias com prazos de pagamentos de até 180 meses.
De
acordo com a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), o programa
especial para pagamento à vista beneficiou milhares de pessoas físicas e
jurídicas, permitindo a regularização de débitos tributários com
redução de multas em até 90% e juros em até 40%. No período de janeiro a
agosto de 2011, a arrecadação em todas as modalidades de pagamento foi
de R$ 14,3 bilhões. A partir de setembro de 2011, a arrecadação mensal
ficou em torno de R$ 1,2 bilhão.
O Refis permitiu
que a MD Empresas, que trabalha com soluções em vendas e como
contact-center para a uma operadora de telefonia móvel, respirasse mais
aliviada. “Ainda sobrou fôlego para cumprir com todas as demais
obrigações fiscais e trabalhistas”, destaca o diretor Carlos Eduardo
Moi. Para ele, com o aumento do número das parcelas e o desconto
oportunizado, a empresa conseguiu cumprir com um projeto antigo de
expansão. “O parcelamento nos favoreceu muito, pois permitiu a
viabilização do pagamento dos impostos atrasados com a Receita Federal
gerados em momentos de dificuldades da empresa”, completa.
Há
14 anos no mercado e com 115 funcionários, Moi não tem dúvidas de que a
alta carga tributária brasileira dificulta a vida de qualquer
organização. “Ser empresário no Brasil é ser um herói”, desabafa.
Segundo ele, os gestores e donos de empresas precisam ser maleáveis,
criativos e muito empreendedores, pois são submetidos a uma série de
barreiras na ordem tributária, trabalhista e estrutural, e ainda
precisam sobreviver em meio a todas as dificuldades. Ele considera
abusivo o valor dos impostos praticados no País e diz ser esse o maior
entrave no item competitividade. “Além disso, as altas taxas de juros
cobradas pelos bancos para capital de giro e alavancagem financeira
tornam ainda mais difícil a vida de uma instituição”, reclama.
Simples precisa atingir mais empresas
O
Simples Nacional foi criado com o objetivo de unificar a arrecadação
dos impostos e contribuições devidos pelas micro e pequenas empresas. “A
iniciativa do governo ajudou, mas não resolveu o problema da tributação
no País”, afirma o gerente-societário da Confirp Contabilidade, Eduardo
Amaral. “O Simples ainda não enquadra grande parte das empresas que
precisavam de benefícios fiscais”, comenta.
Segundo
ele, muitas empresas do lucro real e do presumido não conseguem
sobreviver pagando a tributação normal. “O Simples é um bom incentivo,
mas precisa ser mais bem estruturado para atingir outras empresas”,
reforça o advogado ao lembrar que, caso a empresa incluída nesse sistema
venha a ter alguma situação de inadimplência e irregularidades com o
fisco, ela é automaticamente desenquadrada dessa categoria.
Mas
há meios de driblar a situação sem que haja sonegação ou acúmulo de
dívidas. Conforme Amaral, tudo inicia por um bom planejamento tributário
antes mesmo de montar um negócio, ou seja, definir o regime da
atividade de acordo com a carga tributária que melhor se enquadra.
Deixar
de pagar os compromissos fiscais pode gerar muitos transtornos futuros,
entre eles, a obtenção da certidão negativa, fundamental ao fechar um
novo contrato comercial, por exemplo. O fato de se manifestar junto à
Receita, explica Amaral, sempre será favorável. “Mas ainda ficamos
dependentes dos governos no sentido de melhorar nossa legislação
tributária”, reclama.
De acordo com Amaral, a
demora em realizar a consolidação das dívidas por parte da Receita se
deve, principalmente, porque o órgão esperava receber os valores pagos à
vista, contudo, foi grande a procura pelo parcelamento, e o software
do governo não estava preparado.
Empresas de ônibus conseguem reduzir valores
Uma
decisão inédita no Rio Grande do Sul abre brecha para que outras
companhias recorram aos tribunais. Duas empresas de ônibus do Estado
conseguiram reduzir os valores parcelados no Refis da Crise. Um dos
advogados dos contribuintes, Rodrigo Freitas Lubisco, da Totum
Empresarial, conta que o escritório realizou uma auditoria e verificou
erros nas contas da Receita Federal, calculados no programa. Em 14 dos
18 débitos previdenciários, os honorários dos advogados da União foram
apurados com percentual superior ao que havia sido estabelecido pelo
juiz da execução do débito.
O erro foi reconhecido
pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) em Porto Alegre. “A
tese é que os honorários estão sendo ilegalmente cobrados e, nesse caso,
essa ilegalidade foi reconhecida, o que abre margem para que outras
empresas busquem analisar suas negociações”, alerta o advogado. Segundo
Lubisco, a prática de aplicar nas negociações os valores correspondentes
aos honorários dos advogados da União é comum, e, na maioria das vezes,
o percentual varia entre 1% e 5% do valor da causa, mas o sistema da
PGFN aplicou automaticamente o equivalente a 10%. Procurada pelo Jornal
do Comércio, a PGFN disse que não se manifestaria sobre o assunto.
O
advogado conta que a soma da dívida de uma das empresas chegava a R$ 17
milhões no programa de parcelamento, instituído pela Lei nº 11.941, de
2009. Desse montante, R$ 2,5 milhões eram correspondentes aos
honorários. Com a decisão, o valor a ser pago para remunerar os
advogados da União diminuiu para R$ 1,7 milhão. No outro caso, a redução
foi ainda maior. Os R$ 960 mil devidos caíram para R$ 270 mil. Segundo
Lubisco, o erro é recorrente, e diz que os advogados têm buscado a
Justiça para questionar o entendimento do fisco. O argumento utilizado é
de que a Lei do Refis não previa a inclusão dos valores devidos em
honorários no programa de parcelamento.
Planejamento e gestão são as armas do negócio
Se
a prestação cabe no orçamento mensal, o montante total da dívida,
muitas vezes, não preocupa tanto o devedor. O consultor contábil Charles
Tessmann está acostumado a ver seus clientes buscando os parcelamentos,
mesmo que os juros sejam muito altos. “Essa é uma questão cultural no
Brasil”, acredita. Um bom planejamento e gestão dos negócios podem ser a
solução para que as empresas não venham a ter problemas com o fisco.
Apesar disso, o especialista compreende que a carga tributária é a maior
responsável pelo endividamento financeiro. “O governo sabe disso, por
isso abre seguidamente os programas de parcelamentos”, critica Tessmann.
Em razão dos paliativos, conforme ele, o problema tributário no Brasil
acaba não sendo resolvido, pois a cada ano aparecem soluções que aliviam
aparentemente o peso nos ombros do empresariado brasileiro.
Para
Tessmann, não há vantagem em deixar de pagar os tributos mensalmente,
pois os juros e as multas são muito altos, cerca de 30 a 40% a mais no
débito total. E aconselha os empresários a tentar priorizar os impostos.
No caso de quem já esteja no parcelamento, é importante frisar que as
empresas deverão estar em dia com as parcelas para continuar no
programa.
Para o gerente societário da Confirp
Contabilidade, Eduardo Amaral, muitas empresas, para se manter, precisam
que o governo lance um novo parcelamento, além do Refis da Crise,
editado em 2009. Segundo ele, existe o Projeto de Lei 3.100/2012 que
solicita a reabertura do programa para que mais empresas possam aderir.
De acordo com Amaral, só no seu escritório, dos 800 clientes, 200 deles
estão pagando as dívidas com o governo dentro do Refis, um número
bastante expressivo. Segundo ele, a causa do endividamento dos
empresários está na alta carga tributária, insuportável para a grande
maioria dos brasileiros.