Apesar da promessa de simplificação, especialistas temem que a folha de pagamento digital aumente o trabalho no setor de RH
Hugo Passarelli e Mariana Congo
A
folha de pagamento digital (ou eSocial) vai unificar num único sistema o
envio de todas as informações dos trabalhadores aos órgãos federais.
Para se adaptar, as empresas terão de mudar a maneira como tratam esses
dados.
Segundo a avaliação do sócio da consultoria Deloitte Dario Mamone
Júnior, a maior parte das informações prestadas será de competência da
área de recursos humanos (RH) das empresas, mas a integração entre
setores será fundamental, principalmente na fase inicial de adequação ao
sistema. "Estima-se que 60% de todas as informações necessárias ao
eSocial venham do setor de RH, os outros 40% seriam divididos entre
medicina do trabalho, compras, produção, vendas e fiscal. Com o eSocial o
governo vai ter um retrato de todo tipo de vínculo trabalhista", diz.
Para a coordenadora da área trabalhista e sócia do Marcelo Tostes
Advogados, Carolina de Pinho Tavares, haverá um aumento significativo
de trabalho no setor de RH e isso vai exigir mais mão de obra. "Ainda
que, no futuro, a proposta do governo seja de simplificação, essa
obrigação será muito dispendiosa para as empresas", acredita.
Em geral, o eSocial transporta para o ambiente digital obrigações
que já são cumpridas pelas empresas atualmente. Mas existem novas
informações cadastrais sobre funcionários que passarão a ser
obrigatórias, segundo previsto no layout do eSocial.
Um exemplo são os dados sobre se o trabalhador tem casa própria
ou se usou o FGTS. "É um pedido da Caixa Econômica Federal. Isso pode
gerar uma necessidade de acomodação para as empresas no começo, mas, de
forma geral, as obrigações já existem e estão de acordo com a CLT",
avalia o sócio da PWC Marcel Cordeiro. Por isso, segundo ele, a
expectativa é de que a burocracia diminua em médio prazo.
A assessora jurídica da FecomercioSP, Ana Paula Locoselli, diz
ter dúvidas se haverá, de fato, uma simplificação na prestação de contas
ao governo. "A primeira impressão que tive sobre os layouts do eSocial
(que vão orientar como preencher o cadastro) é que eles são
complicados", diz.
Complicado? Para cada funcionário, até 48 eventos deverão ser
enviados ao sistema (como admissão, acidentes de trabalho e folha de
pagamento). Muitas empresas reclamam que esse é um número alto. Mas a
Receita Federal refuta essa ideia.
"Nós não aumentamos o número de informações pedidas, são as
mesmas informações que hoje são registradas. O que fizemos foi dividir
para facilitar o envio cada vez que o evento ocorre. A empresa não tem
que ficar juntando para mandar um único arquivo", diz o coordenador de
Sistemas da Atividade Fiscal da Receita Federal, Daniel Belmiro. Ele
lembra que o eSocial não é mais um programa de computador que a empresa
terá que instalar, e sim um sistema que vai se comunicar com o sistema
que a empresa já tem.
Na avaliação da gerente especialista em soluções de Tax &
Accounting da Thomson Reuters no Brasil, Victoria Sanches, o impacto do
projeto do eSocial ainda está sendo subestimado pelas empresas. "Não vai
mais para dar ‘jeitinho’ em nada. O eSocial marca uma nova era das
relações de trabalho", diz.
Trabalhador. O eSocial também vai permitir que os próprios
trabalhadores "fiscalizem" se as empresas estão cumprindo com suas
obrigações, como o depósito do FGTS, e tenham mais facilidade na
produção de provas para processos trabalhistas. Da mesma maneira, as
empresas terão como comprovar de forma mais fácil que estão em dia e não
devem nada aos colaboradores.
Testes. O sistema só deve estar em pleno funcionamento a partir
de 2015. Para testar o eSocial, o governo tem trabalhado conjuntamente
com um grupo de 48 grandes empresas (chamado de GT48) que estão ajudando
a encontrar falhas e propor melhorias ao sistema antes de sua
obrigatoriedade.
Com 10 mil funcionários, sem incluir terceirizados, a operadora
Claro é uma das empresa da fase de testes. A empresa tem hoje sete
softwares de gestão corporativa, que fazem, por exemplo, folha de
pagamento, passando pela gestão de pessoas, jurídica e fiscal. Para se
adequar ao eSocial, a empresa está realizando a integração dos sete
softwares, de forma que todos sejam aderentes aos layouts do eSocial.
A diretora de planejamento tributário da Claro, Alessandra
Heloise Vieira, está no comando do grupo que reúne representantes de
vários departamentos para traçar a estratégia de adequação ao eSocial.
Dentre os problemas previstos, Alessandra conta um simples "meu próprio
nome dará incompatibilidade no eSocial, pois meu cadastro, quando entrei
como funcionária na Claro, tinha meu nome de solteira. Depois que eu me
casei, o meu nome junto ao CPF foi atualizado, mas o cadastro na Claro
continua igual".
Emprego. Além de alterar o cotidiano das empresas, o eSocial vai
impactar na coleta de dados que orientam políticas públicas, como o
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
"Com a implantação do eSocial, nós passaremos a receber novas
informações, mas, em paralelo, continuaremos a receber a Rais e o Caged.
Assim que nós vejamos que o que está vindo pelo eSocial é uma
informação de qualidade, passaremos a substituir o envio atual", afirma
José Alberto Maia, auditor fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE). "A estimativa é, do terceiro ou quarto mês, nós já saberemos se o
Caged já estará a contento", diz.
Fonte: Estadão
Matéria publicada no site: http://www.contadores.cnt.br/
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